Sentada abraçada às pernas, ela fitava através das lágrimas a chuva que batia insistente nas vidraças da janela. Seu mundo interno exposto a torrente de emoções, deixava a cabeça anuviada cheia de indagações. Sem perceber, lá fora em meio as águas, alguém a espreitava com olhar curioso, tentando saber o que havia em tão triste semblante, naquela alma dolorida. Ele não podia interferir. Assim havia sido alertado. Mas podia sentir as dores, que instigavam a alma atormentada. Se pegássemos o instante anterior as dores plenas que agora a inflamavam, veríamos a singeleza de uma alma, que ao fazer escolhas, seguiu a favor de sua vontade, esquecendo que quem nos guia é a alma. Numa vida onde sempre ouviu a intuição e a voz que lhe ressoava, optou por outra estrada, indo de encontro as facilidades e tranquilidades da vida, mas não com o que ansiava. Lágrimas de culpa jorram unidas as lágrimas de uma dor já instalada. A culpa corroendo seus dias, pois entregue a sua vida, espíritos dos bens, seguem sua caminhada. E a culpa lhe assombra. Dentre todas as experiências vividas passadas, um quê do que ainda falta para alcançar a plenitude de amar e ser amada. Em meio a tristeza daquele quadro, ela enfim o vê lá fora. E sai na busca desenfreada por respostas, imaginando que talvez ele seja o único a resgatá-la. Mas ele não percebe essa saída transloucada e sai a passos a fim de se sentir forte para o dia que terá que encontra-lá. A chuva castiga ainda mais e de cabelos e roupas grudadas, ela segue descalça pelas ruas, na sofreguidão de querer, encontrar suas respostas. Sem rumo, e a chuva caindo ainda mais forte passa a castigá-la, até que sofrida, dolorida, cai no abismo da alma desolada. Eis que ela acorda! Uma lâmpada fraca treme, num pingente de luz tênue. Fraca, com pés e mãos atadas ela se põe em alerta, derrotada. Não percebe que as ataduras são simples faixas com remédios a curar suas feridas. Ele não se aproxima. De longe fita a sua enferma. Espera que ela se tranquilize, e então possa se aproximar e acalentá-la. Depois de tomar ciência de que não estava em casa e que naquele lugar, embora lúgubre, havia um calor reconfortante de uma lareira, ela começa a sentir-se em paz, mesmo estando tão longe, de casa. Ele não se move. Não pretende assustá-la. Deixa que ela se levante busque o caldo quente, que já fumegava e tente mesmo com mãos machucadas, aquecer o corpo dolorido por tudo que havia se passado. Então ela sente que olhos a espreitam. Mas, não corre, não tem medo..sente que é o olhar que há tanto espera.. Ela diz quem é, e espera que ele faça o mesmo. Mas não. Envolvido em grande emoção, a fita, sem saber o que realmente os espera. Depois de aquecida, ela vai de encontro à ele, que apenas a olha. Nesse momento quando os olhos se encontram, não há palavras, apenas o sentir que naquele momento se instala. Tonta da fraqueza que ora estava, ela cambaleia e protegida, é levada em seus braços de volta a cama. Na noite escura, fria, onde o vento entoa uma canção,e onde a lenha grita aquecendo o ambiente, ele vela o sono triste dela. No tardar da hora acorda e encontra a sua frente, aquele salvador que ela não sabe quem é, mas que sabe, aquece sua alma. E ela começa a divagar. Conta cada etapa de toda sua história. Chora lágrimas de arrependimento. Chora lágrimas de saudades, do que sabe que deixou do lado de fora. E se põe a perguntar. E ele sem poder interferir, apenas lhe estende os olhos, e a mão para encorajá-la. Ela chora suas mágoas. Grita suas dores. Lamenta as escolhas, que por longo tempo a fizeram feliz. E novamente se poe a perguntar, o por quê de tudo coexistir dentro dela? E mesmo tendo tudo, ainda assim, a alma quer muito mais dela! Ele movido pelas palavras, diz que os caminhos são muitos, mas que todos se interligam na estrada. Afirma, que mesmo ela julgando ter feito escolhas difíceis, ainda assim, era preciso galgar esses degraus, para alcançar o que a alma desejava. Chorosa em sua lamúria diz: mas por que então dói a minha alma? Ele sorri e diz que a alma necessita de luz, de tudo que a faça vibrar e somente o verdadeiro amor é capaz de libertá-la. Intrigada ela custa a acreditar que diante de si, já consegue encontrar algum alivio ao ouvir tão amáveis palavras. Mas como prosseguir? pergunta ela...eu não posso ferir ainda mais, aqueles que em meu caminho escolhi. Eles são muito para mim! O sorriso amável dele toca sua face e tal qual um sopro de esperança, diz que embora tudo pareça não fazer sentido, ainda assim, o fim do caminho já está traçado. Com um leve afago em sua testa ele afirma, que tudo , tudo está interligado. Não mais te desespere! Acredite na força, do que tua alma pede. Sonhe. Busque. Dê a ela o que a faça sorrir. O mundo, está cheio de sorrisos fartos e olhos sombrios. Aliviada, mas ainda não bem convencida diz que precisa voltar, se ele lhe indica o caminho. Percebendo que a força dela já retorna, diz que como sempre a levará de volta. Ela não entende, mas aceita mais esse carinho. E assim, protegida ela volta ao seu lugar, de onde certamente não havia necessidade de ter saído. A chuva já se foi e um tímido sol, parece surgir. Nas portas de sua casa, emocionada ela o abraça e o vê sorrir. Quando já alcançava o interior, lembra que o seu nome não escutou. Num ímpeto vira-se e grita: -meu amigo, Como te chamas? -Eu sou aquele que sempre te acompanha. -Que chora e ri contigo e que muito te ama! Ela, deveras emocionada por não esperar ouvir aquilo e sem saber que magia existia naquelas palavras, diz : - Como podes estar sempre comigo? -Ele à olha profundamente e com mãos dentro dos bolsos num ato displicente, responde: -Não existe tempo, nem espaço onde existo. Estou em ti e tu em mim, há uma infinidade de anos. -Me chames como quiseres.... -Posso ser teu amigo, Protetor ou Amor... -Mas antes de tudo, sou aquele que dizem ser anjo!

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